11/06/2014

VEREDAS NO "GRANDE SERTÃO"


O Grande sertão: veredas, obra maior de Guimarães Rosa, é um relato pontilhado de vozes, sonoridades e o entrecruzar de comentários e informações emitidas em todos os níveis.

É narrado por Riobaldo, um vaqueiro meio “letrado” que, por essas coisas do destino, se vê ali como jagunço “no meio do redemunho”, dentro do sertão e das aventuras que vão acontecendo.

Quem "ouve" as estórias contadas pelo protagonista Riobaldo é um homem misterioso e culto (ou o próprio autor, que ouviu de jagunços e vaqueiros os ‘causos’ transformados e refundidos em esplêndida trama ficcional) que jamais aparece, fica sempre na penumbra dos fatos.

Muitos leitores começam a ler o livro e param logo no início, porque querem "entender" imediatamente a narração, mas com isso incorrem num grande erro. É preciso avançar nas primeiras páginas, apenas ouvindo aquela estranha música, pois trata-se de um poema de grande fôlego, uma epopeia porém em prosa e que necessita de se espraiar para tomar corpo.

Quando os seus sentidos perceberam aquela melodia, você já estará trilhando aqueles novos caminhos, por dentro de palavras mágicas, e a estória do livro, trazida de dentro da construção vocabular e sintática de Rosa, se tornará conhecida e familiar.

Outro dado interessante é que dentro do Grande Sertão, há muitas pequenas estórias, entre elas o caso de Maria Mutema, o do Aleixo e o do Pedro Pindó. Vou tentar resumir os dois últimos, a seguir.

O Aleixo era um homem mau que vivia no Passo-da-Areia, junto a um açude onde criava traíras.
Um dia, Aleixo matou, sem motivo, um velhinho que por lá passara pedindo esmola. Antes de um ano se passar, seus quatro filhos adoeceram com uma espécie de sarampo, tiveram os olhos vermelhos e ficaram cegos.
Aleixo não enlouqueceu, mas mudou completamente sua vida, passando a fazer caridade dia e noite.

Já o caso de Pedro Pindó apresenta uma mudança do posicionamento dos personagens. Pedro e sua mulher viviam sossegados e no caminho do bem. Mas tiveram um filho de nome Valtêi que tinha maus instintos e maltratava e feria pessoas e animais. Os pais, então, começaram a surrar o menino até sangrar. Com o tempo, habituaram-se a bater nele todos os dias. O menino foi emagrecendo e os pais quanto mais batiam, mais sentiam prazer naquilo. Diziam os vizinhos que o menino não iria durar até a próxima quaresma.

Assim são – dentro da trama maior – as pequenas estórias de Guimarães Rosa no Grande sertão: veredas e nos demais livros. Relatos cheios de mistério e estranheza que retratam a vida num sertão cercado tanto de fantasia, religiosidade e preconceitos como de belos gestos e de aventuras fantásticas.
Depois desse romance o leitor nunca mais será o mesmo.

Guimarães Rosa, João. Grande sertão: veredas. Rio de Janeiro: J.Olympio, 2ª ed., definitiva.

Um comentário:

vitor cardoso de oliveira disse...

O que mais me interessa no Veredas é a figura de Diadorim que lembra a quarta criança do anime Evangelion: Kaoru. Kaoru não é humano, como Diadorim me parece ter um amizada diferente no anime. Então sempre há aquele amigo. O que quero dizer é que Diadorim parece frio e mau. Como Kaoru que só quem assistiu Evangelion na Locomotion vai entender, que não é um amigo mas um inimigo, e Riobaldo sente uma amizade ambígua por Diadorim, um caso psicológico enfim talvez um caso Nietzcheano como tem num texto dele do qual não me rocordo o nome. Neto da Celina. Um abraço.